Tuesday, May 22, 2007

Afirma Pereira!


PP no seu último artigo no Público brinda-nos com uma pérola da inconsistência lógica e da sabedoria rasteira. A abertura é solene chegando quase a soar às primeiras vozes do coro dos prisioneiros no Fidelio. Vale a pena reproduzir: Nós pensamos muitas vezes apenas nos partidos, mas, em democracia, mais importante do que os partidos é a dualidade poder-oposição ou, melhor ainda, a existência ou não de um tónus crítico do debate público que não seja afectado pela presença obsessiva do poder. Liberdade não só no papel, mas também nas cabeças. E essa não só falta, como está a ficar cada mais rarefeita. Belo, corajoso, heróico. Este panegírico da liberdade e da democracia vem a propósito do apoio explícito de Saldanha Sanches e Júdice à candidatura do PS à Câmara de Lisboa. Por isso, ambos os militantes do PSD são acusados pelo articulista de caucionarem o “poder”. Até podia ter algum interesse esta tergiversação sobre o “poder” e os seus malefícios, caso este não fosse simplesmente assimilado ao fantasma do poder socialista. Mas o problema maior, e aqui chegamos à incoerência lógica e à sabedoria rasteira tão ao gosto de Pereira, é que PP acusa Sanches e Júdice de fazer justamente aquilo que ele elogia no princípio; isto é, de pensarem pela sua própria cabeça para além, e ao arrepio, das filiações partidárias. A acusação de PP pode resumir-se ao seguinte responso: os “meninos” podem pensar pelas suas cabeças desde que não façam nada que prejudique a estratégia partidária, neste caso do PSD. É que, se a oposição que deve ser feita é ao que “é” é fácil constatar que esse, em relação à Câmara de Lisboa, só pode “ser” o PSD. Foi o PSD que esteve no poder durante mais de dez anos! Foi o PSD que mudou de executivo camarário por causa de estratégias políticas individuais do seu presidente. E foi o PSD que, enquanto gestor do município, enveredou por um processo de recrutamento inaudito de militantes do seu próprio partido, onde se conta o executivo camarário que mais acessores tinha de todos os tempos. Processo esse que começou com Santana Lopes e atingiu o apogeu no reinado de Carmona. A este propósito, convinha antes de mais saber até onde se estendem os tentáculos do polvo. Será Santana Lopes absolutamente alheio às manigâncias do seu sucessor? Será que a corrupção, as negociatas, o esbulhar da coisa pública em proveito próprio só começaram com Carmona? E se, como afirma Pereira, o PS estava já envolvido com a Bragaparques não será a conclusão necessária de que a oposição, a existir, devia ser feita aos dois executivos camarários: ao do PSD e ao do PS? Para mais, se António Costa se deve demarcar deste “passado”, por maioria de razão, Sanchez e Júdice devem demarcar-se do outro “passado”, o do PSD e da sua gestão camarária desastrosa. O que está aqui em julgamento, pese embora a retórica pereiresca, é a actuação do PSD na Câmara – esse é o único passado a que os eleitores devem ser particularmente sensíveis, sobretudo porque é ele que se encontra de jure e de facto penhorado pelas instituições da república.
Parece portanto que estamos perante um estranho caso de dislexia política. Onde PP diz “poder PS” deve ler-se “poder PSD”; onde PP vê tibieza por parte dos dois acusados, deve ver-se clareza segundo os princípios da liberdade de opinião e não dos enfileiramentos partidários.

1 Comments:

Blogger brunopeixe said...

E, claro, o PP nem uma palavra diz do seu apoio a carmona, um boy do santana, de quem o PP era tão crítico. E porque é que PP o apoiou? Porque era do PSD. Só isso. Por mim não vem daqui grande mal ao mundo. Só convinha é que não nos tomasse por parvos com este "faz-de-conta que sou muito independente do partido".

12:29 AM  

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