Monday, August 20, 2007

An Enquiry concerning the foundations of the gay lobby

A polémica sobre a investigação levada a cabo por Pedro Arroja possui aspectos muito curiosos. Pedro Arroja defende que Hume é o pai teórico da homossexualidade; que foi o seu relativismo moral que ofereceu a necessária caução à homossexualidade e permite aos homossexuais reclamar direitos iguais. Deixemos de lado o facto de o raciocínio poder ser utilizado, rigorosamente da mesma forma, em relação às mulheres. Na medida em que estas eram vistas como seres moralmente diferentes (inferiores, também) sobretudo pela doutrina católica, o relativismo moral de Hume poderia, argumento ad absurdum, ter caucionado a sua paridade de direitos. Isto só mostra que Arroja está a brincar com uma petição de princípio.
Estabelecer a paternidade do movimento homossexual na filosofia de David Hume é, antes de mais, um elogio e uma honra para o movimento. O feminismo não tem a fama de ter arrastado filósofos tão ilustres, independentemente de ser este moralmente relativista ou não, como Arroja parece crer. Nem a discussão se encontra ao nível filosófico. O que Arroja pretende demonstrar, antes de mais, é que as ideias são influenciadas pela orientação sexual. O que poderia ser admissível – não deve haver baias para os verdadeiros homens de génio – se ele não reduzisse a questão a uma putativa relação gay entre Hume e Adam Smith. E assim é, porque há outros pares famosos, supostamente gays, onde a sua teoria da relatividade moral seria mais difícil de sustentar. Em Keynes e Wittegenstein, putativos gays, dizem as más línguas, é complicado utilizar a gazua do relativismo moral, o que nem um nem outro eram. Outras situações, de comprovada dissolução moral, mas onde o próprio projecto modernista entroncava com esta postura, como a de Rimbaud e Verlaine, também podiam ser chamadas à colação. Porém, o facto de a arte ser, para utilizar os termos de Badiou pelos quais nutro um particular carinho, aquilo que “presents the sensitive in the finitude of a work”, a relação homossexual não é controversa, até lhe dá colorido e é sabido que alguns poemas de Rimbaud faziam gala em ser gay; como por exemplo o poema Âge D’or em que o boémio escritor repete incessantemente Si gai, si facile/Si gai, si facile – não engana. Mas Arroja é ainda mais arrojado, e quando Hume desprevenidamente coloca o vocábulo “gay” no meio de uma sua frase, o arrojado Arroja não tem dúvidas em sublinhá-lo acusando perentório, aqui está a prova! Hume, está bem de ver, e seguindo Arroja, encobria esse seu desejo pederasta sob o manto de belas frases e apodíticos pensamentos sobre os franceses, que são todos paneleiros, mesmo o Robespierre, que por se encontrar num directório só podia ser gay. E quando ele escreve "because I was afraid that the civilities and gay company of Paris would prove disagreeable to a person of my age and humour…” (sublinhado do Arroja) depois reconhecendo que afinal não era assim tão mau como pensava, temos que dar a mão à palmatória que Arroja farejou algo que tinha passado despercebido, durante mais de dois séculos, a todos os exegetas da obra de Hume. Esse algo é revolucionário. Primeiro, que Paris era o epicentro dos gays da altura, com festas de arromba, gang bangs homos, ondas císmicas de lascívia máscula e viril; segundo, que David, primeiro envergonhado, acabou por se render ao crime de sodoma e perante as festas paradisíacas dos gays parisienses sair do armário, como drag queen que sempre sonhara ser. E onde entra Adam Smith? Smith só podia ser gay, porque passava a vida a imaginar uma mão invisível, e terá uma vez dito ao arcebispo de cantuária que se este lhe desse uma mãozinha ele era capaz de pôr uma fábrica de alfinetes a funcionar. Alfinetes, espetam, espetar, gay. Os traços são por demais evidentes e deixam um rastro inexorável. Obviamente, que o que encantou Hume em Smith foi a possibilidade dessa “mão invisível” que por o ser até se podia usar nos salões da sociedade literária da época a qual Hume gostava particularmente de impressionar, sobretudo quando esbugalhava muitos os olhos e passava avidamente a língua pelos lábios. Resultado, Hume e David formaram uma dupla inolvidável que se passeava pelas pastagens escocesas. Durante uma época de saltimbancos – que é a coisa mais gay que se pode ser – apresentaram um espectáculo de rua que consistia em refutar o nexo causal com a ajuda da mão invisível. Num dos sketchs, Hume levava uma estalada em cheio nas suas bochechas vermelhuscas e concuspiscentes (ver fotografia aapensa), mas não sabia donde, porque não havia mão nenhuma e Smith assobiava para o ar, com ar destraído, mantendo as mãos atrás das costas (número que seria mais tarde adaptado pelos irmãos Marx no clássico Heil Fredonia). Ficavam assim provadas duas teses que iriam para sempre influenciar o mundo. Por um lado, um efeito não tem necessariamente a mesma causa, nem pode esta ser predita pela análise do efeito; por outro, há mãos que na realidade são invisíveis, mesmo quando tomadas metaforicamente. Diz-se que Hume se afeiçoou à mão invisível de Smith porque esta se coadunava com a ideia segunda a qual a razão não é base da nossa percepção indutiva, mas sim a natureza. Forma de dizer, não a concebo mas sinto-a.

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