Há coisas fantásticas, não há?
O Sr. Gordon Brown parece que não se quer sentar à mesma mesa do Sr. Mugabe em Lisboa. Diz que é por causa dos atropelos aos direitos humanos no Zimbabwe. Como argumentou o Daniel Oliveira, parece que ele afinal não é assim tão comichoso. Se calhar tem a ver com o facto de as vítimas de Mugabe serem brancas e descendentes de ingleses. Nada de novo. O luto e a comoção públicas não são iguais para todos. Na economia política da vitimização, há defitivamente seres humanos que valem mais do que outros. Os imigrantes pobres do terceiro mundo, como sabemos, não estão muito bem contado no mercado de velores mediático.
Veja-se o silêncio que cobriu o seguinte caso. Na noite de 3 para 4 de Maio deste ano, um barco, levando cerca de 160 pessoas, partiu da cidade Haitiana de Cap-Haïtien para as ilhas de Turks e Caicos (T & C), colónias inglesas (ou melhor, desde 1981, territórios ultramarinos - o que é que isto me faz lembrar?). Fugiam de um país miserável para tentarem a sua sorte numa ilha famosa pelo turismo de luxo e com estatuto de off-shore, onde a maior parte do trabalho desqualificado é feito por haitianos. Por volta das quatro da manhã de 4 de Maio, uma lancha da polícia de T & C interceptou o barco haitiano. De acordo com os sobreviventes o barco foi abalroado pela lancha da polícia, tendo-se virado. Alguns sobreviventes dizem que a polícia os deixou à espera 15 minutos na água infestada de tubarões. Outros que a polícia lhes bateu com bastões quando tentavam subir a bordo da lancha. Pelo menos 61 haitianos morreram.
Os sobreviventes, depois do resgate, foram colocados durante uma semana num campo de detenção, após o que foram transportados de volta para o Haiti. Os corpos dos mortos foram enviados dez dias depois e colocados numa vala comum.
2 Comments:
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Nuno Castro, deixo aqui o que foi escrito no meu blog
O problema central da teoria do estado é o problema da moderação do poder politico – da arbitrariedade e do abuso de poder, da liberdade que concedemos ao estado e a que subtraímos ao individuo – jamais ignorando que toda a politica consiste na escolha do mal menor. O paraíso não existe e quem o procura arrisca-se a encontrar o inferno. Liberdade não é equidade, justiça, ou felicidade. Mas, citando Berlin, “restringir a liberdade não é fornece-la, e a coacção, não importa quão bem justificada seja, é compulsão e não liberdade”. O liberalismo moderno tem inúmeras faces e todas elas buscam uma ordem fundada na liberdade individual e na alternância de propostas concorrentes no exercício do poder apenas limitado pelo império da lei. A teoria liberal do governo representativo aponta-o como um dos instrumentos para limitar o poder, e não como fonte de um poder absoluto. O liberalismo está aberto à mudança pois não é a verdade revelada. Esta pede liberdade crítica para a gradual alteração de leis e costumes, uma fiscalização que visa a correcção e reformulação de politicas públicas. É esta possibilidade de reforma gradual que a democracia liberal assegura. Um regime pragmático cuja ordem emana mais das rotinas da praça e da rua do que do quotidiano dos corredores e salas em que os burocratas habitam.
O totalitarismo em oposição vive num labirinto de dogmas, tabus, certezas. Um mundo imutável, pré-estabelecido, historicista que não resiste aos ventos da história. Não estão preparados para a mudança e quando a enfrentam o castelo ideologico vem abaixo
No que respeita ao mercado, seguindo o pensamento de Popper, o que se contesta no modelo socialista nem sequer é a sua anti-economia, é a sua negação da liberdade e a sua desumanidade. Citando Popper “não estamos dispostos a trocar a nossa liberdade por um prato de lentilhas.” Acreditamos na liberdade pois acreditamos nos nossos semelhantes, e o objectivo de uma sociedade deve ser o de facultar a realização do maior numero de planos de vida individuais. A liberdade deve ser o chão do jogo económico. Pois só a liberdade do e no mercado permite a cada um buscar os seus próprios fins. De qualquer modo, factos são factos, o mercado não é apenas o mais adequado à ordem social como resulta razoavelmente bem. O mercado numa visão puramente marxista não é socialmente justo – nem isso procura – mas justiça social num estado de liberdade não é possível. E num estado totalitário como todos vimos a “justiça” só existe se considerarmos a miséria massificada justa. O mercado não é idílico, utópico ou ideológico, organiza-se espontaneamente em virtude da auto-organização dos seus elementos, não obedece a dogmas pois estes pedem a acção do homem e não a sua indolência.
O estado liberal moderno não se orienta pela visão messiânica de um mundo utópico, não procura visões idílicas nem o delírio perfeccionista, procura regular e administrar o jogo social. A transformação das regras sob a custódia do governo deve apenas reflectir a marcha da história. A religião pode ser um dos grilhões da vida humana mas responde às perplexidades da humanidade. A cristandade é mais do que as superstições de um grupo de nómadas. Escreveu a História – a nossa História – trouxe o elogio do perdão de Cristo ou o amor ante o próximo e carregou ao longo dos séculos até aos nossos dias o legado romano. Faz parte da herança cultural do ocidente.
A bíblia é a palavra de deus, a verdade revelada. Por isso imutável. Fé em deus, pelo menos o deus da cristandade, pede fé no criacionismo, no dilúvio e varias imprecisões científicas. Acredito numa ordem espontânea, acredito na atmosfera primitiva, acredito no caldo primordial, se esta não exclui o deus moral que pune os fornicadores, os homossexuais, os amantes de si mesmo, exclui o deus ordenador do universo. Há quem acredite no deus cristão, nada a opor, tenho entre a família mais próxima quem acredite, e não consigo defender uma ordem em que os impeça o exercício legítimo da fé. Negar o direito de cada um exercer fé no que quiser, de fazer o que bem entender, viver como desejar, não é apenas iliberal, é revolucionário e um passo a caminho da tirania.
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