A revolução de Outubro
Tanto rebate de consciência que anda por essa blogosfera. Tanto “eu até acreditei, mas finalmente vi a luz” que anda por essas caixas de comentários. Tanta denegação dos factos com amor aos princípios. Tanto paternalismo serôdio porque afinal se enganaram. E tanto riso escarninho porque afinal o erro foi abissal.
Da revolução de Outubro, o que me apraz dizer é que actualmente na Rússia festeja-se um horrífico dia de nacionalismo. O feriado de 7 de Novembro foi apagado das celebrações Russas e substituído pelo 4 de Novembro que marca o fim da ocupação polaca de 1612. O 7 de Novembro, como emblema de um passado que, mal ou bem, se inscreveu indelevelmente na grande nação Russa, fora mantido até por Yeltsin, não obstante o ter renomeado. O 7 de Novembro passou então a chamar-se “Dia do Acordo e da Reconciliação”. Mas isto, como apagamento da história, como rescrita, não chegava. Era apenas um palimpsesto que facilmente resvalava para as celebrações do dia da Revolução, quer fosse por inércia quer por adesão genuína. Foi preciso Putin para aplicar uma solução verdadeiramente estalinista.
Não há história que sobreviva à recontagem dos factos pela autoridade máxima da nação. Na sua obseção revisionista, Putin limpou o feriado da revolução do calendário russo – apagou-o da memória. Sucede que a memória não se contenta com prestidigitação. A memória é contumaz e funciona por sedimentos. Talvez por isso é que o estalinismo não a conseguiu inutilizar nem tão-pouco manipular por inteiro. Mas a memória é também perversa e selectiva. Neste caso a perversidade tem consequências que no mínimo podem ser consideradas bizarras, no máximo, assustadoras.
O que celebram os Russos no 4 de Novembro? O nacionalismo primário; o chauvinismo; o anti-ocidentalismo. Por conseguinte, em vez de bandeiras vermelhas que celebravam a revolução ajuntam-se skinheads de todos os cantos do país vociferando morte aos estrangeiros. Afinal o 4 de Novembro assinala a expulsão dos polacos e, mais significativo, o início da dinastia dos Romanov. Se alguém tinha dúvidas contra o czarismo latente de Putin, ficam elas esclarecidas.
Contudo, julgo que nos podemos dar por satisfeitos. Em vez de vermelhos a gritarem pelo socialismo, temos xenófobos do Movimento Contra a Imigração Ilegal em conclave com a Liga Eslava a gritarem contra os comunistas. Falta ver na televisão estas manifestações serem confundidas, inadevertidamente, está claro, com as celebrações da Revolução de Outubro; para que seja dada a oportunidade de um locutor simpático exclamar “estes são os comunistas d’hoje”. Mas não são. Com efeito, 60% dos russos queriam manter o feriado da revolução e não se revêem nas aspirações nacionalistas do Kremlin e dos seus próceres. É que a preocupação de Putin não era tanto a de recuperar um passado glorioso, mas a de impedir as manifestações do dia 7 Novembro, geralmente organizadas como protestos contra o seu governo.
A história é isto: um processo de inscrições e desinscrições. O velho Marx acreditava demasiado nela. Não viveu na época em que ela se reinscreve sem ninguém sequer cismar porquê.
Da revolução de Outubro, o que me apraz dizer é que actualmente na Rússia festeja-se um horrífico dia de nacionalismo. O feriado de 7 de Novembro foi apagado das celebrações Russas e substituído pelo 4 de Novembro que marca o fim da ocupação polaca de 1612. O 7 de Novembro, como emblema de um passado que, mal ou bem, se inscreveu indelevelmente na grande nação Russa, fora mantido até por Yeltsin, não obstante o ter renomeado. O 7 de Novembro passou então a chamar-se “Dia do Acordo e da Reconciliação”. Mas isto, como apagamento da história, como rescrita, não chegava. Era apenas um palimpsesto que facilmente resvalava para as celebrações do dia da Revolução, quer fosse por inércia quer por adesão genuína. Foi preciso Putin para aplicar uma solução verdadeiramente estalinista.
Não há história que sobreviva à recontagem dos factos pela autoridade máxima da nação. Na sua obseção revisionista, Putin limpou o feriado da revolução do calendário russo – apagou-o da memória. Sucede que a memória não se contenta com prestidigitação. A memória é contumaz e funciona por sedimentos. Talvez por isso é que o estalinismo não a conseguiu inutilizar nem tão-pouco manipular por inteiro. Mas a memória é também perversa e selectiva. Neste caso a perversidade tem consequências que no mínimo podem ser consideradas bizarras, no máximo, assustadoras.
O que celebram os Russos no 4 de Novembro? O nacionalismo primário; o chauvinismo; o anti-ocidentalismo. Por conseguinte, em vez de bandeiras vermelhas que celebravam a revolução ajuntam-se skinheads de todos os cantos do país vociferando morte aos estrangeiros. Afinal o 4 de Novembro assinala a expulsão dos polacos e, mais significativo, o início da dinastia dos Romanov. Se alguém tinha dúvidas contra o czarismo latente de Putin, ficam elas esclarecidas.
Contudo, julgo que nos podemos dar por satisfeitos. Em vez de vermelhos a gritarem pelo socialismo, temos xenófobos do Movimento Contra a Imigração Ilegal em conclave com a Liga Eslava a gritarem contra os comunistas. Falta ver na televisão estas manifestações serem confundidas, inadevertidamente, está claro, com as celebrações da Revolução de Outubro; para que seja dada a oportunidade de um locutor simpático exclamar “estes são os comunistas d’hoje”. Mas não são. Com efeito, 60% dos russos queriam manter o feriado da revolução e não se revêem nas aspirações nacionalistas do Kremlin e dos seus próceres. É que a preocupação de Putin não era tanto a de recuperar um passado glorioso, mas a de impedir as manifestações do dia 7 Novembro, geralmente organizadas como protestos contra o seu governo.
A história é isto: um processo de inscrições e desinscrições. O velho Marx acreditava demasiado nela. Não viveu na época em que ela se reinscreve sem ninguém sequer cismar porquê.
3 Comments:
Nao esperava isto vindo de si, pensei que a sua costela - ou será o corpo todo? - aliberal era capaz de verter umas palavras ligeiramente simpaticas pelo novo czar. Estava enganado
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Mas voce nao responde. La na minha terra isto era o suficiente para os cavalheiros escolherem as armas e recuarem dez passos
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