Monday, December 10, 2007

Por que luta o Zé (2)

O terceiro aspecto prende-se com a imanência da revolta. Esta ideia não é a minha; é roubada a Laclau. Por qualquer razão desconhecida, tanto Negri como o Zé pensam que existe uma espécie de imanência na revolta. As pessoas querem revoltar-se; apenas o poder da soberania as impede. Este pressuposto é uma inversão do paradigma hobesiano. O Leviathan é necessário para controlar a guerra de todos contra todos. Aqui, o Leviathan impede a união de todos contra o soberano. A forma como Negri chega a esta conclusão é ambígua. Por um lado, o poder soberano nunca é poder total – é sempre poder partilhado. Ou seja, o poder do soberano está dependente da aquiescência dos súbditos. Por outro lado, o poder soberano é uno; ou seja, congrega a aquiescência dos súbditos numa unidade. A soberania só pode ser exercida através da unidade. Daí que o poder do múltiplo se oponha ao poder do uno, quando a multidão quebra com a aquiescência. Os múltiplos braços e corpos que estão no interior da éfigie do soberano começam a falar na sua língua – suspeita-se que numa heteroglosia. Mas se existe um entendimento do papel constituinte deste múltiplo na sua verticalidade, o que dizer quanto à sua horizontalidade? Por que razão, não descamba este último novamente no “homo homini lupos” anterior ao Leviathan? Quem é que nos garante que o múltiplo não é sobretudo um múltiplo conflitual?
Para além disso, o facto de a relação entre soberano e multidão ser biunívoca parece ser mais uma descrição da relação de poder do que uma especificidade de o poder soberano. Luhman, há muito que insiste que o poder é partilhado, que existe sempre numa relação biunívoca; que mesmo quando se pretende absoluto, o poder tem que possuir uma margem de cedência, ao limite, aquilo que é apontado por Negri, a sobrevivência dos súbditos: poder soberano sem súbditos, não tem existência. Mas se esta biunivocidade é constitutiva de qualquer relação de poder, porventura onde Negri quer chegar é à anulação de qualquer relação de poder e nao apenas o poder fundado na autoridade (cont.).

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