Friday, May 25, 2007

A censura de novo

Há pelo menos dois tipos de censura que raramente são referidos: a censura da aparência pluralista e a censura monetária. Na primeira, a censura funciona como um mecanismo do excesso. A proliferação de mensagens, a dificuldade em distrinçá-las e em organizar o universo simbólico a que elas pertencem, faz com todas elas se equivalam. Uma das formas de ajuizar esta equivalência é aquela que encontra nela o pluralismo democrático, a liberdade maior para escolher num mundo em que a única coisa que deve arbitrar a escolha é a opinião individual. A ideia da pluralidade de escolhas é, quanto a nós, falaciosa.
As escolas anarquistas, quer de direita quer de esquerda, pressupõem um indivíduo inicial que escolhe. Não existe tal coisa. A escolha nunca é individual porque é fundamentalmente o resultado das escolhas de todos os outros. Ninguém pode escolher individualmente porque qualquer que seja a escolha tem que sempre ter em conta as possíveis selecções de todos os concorrentes na mesma escolha. Por exemplo, quando leio o Público gostava que a maior parte dos opinion makers fossem outros, mas infelizmente são aqueles. Não posso escolher porque já alguém fez essa escolha por mim. Réplica imediata: então não leias o Público; lê outro jornal. Mas eu gosto do Público, só que não gosto da maioria dos artigos de opinião. Resposta seguinte: então não leias os artigos de opinião; lê apenas as notícias e os reclames. Mas aqueles que escrevem no espaço de opinião ocupam um espaço que é limitado, que é escasso e por conseguinte estão a roubá-lo a outros que lá poderiam escrever e que corresponderiam melhor às minhas potenciais escolhas.
O segundo tipo é a censura monetária. Nas sociedades de mercado esta está sistematicamente a ser exercida. Porque os recursos se obtêm pela capacidade monetária e porque esta é assimétrica e desigual na maior parte dos casos aquilo que surge como uma escolha é simplesmente o resultado de um somatório de recusas. Não há, por conseguinte, nenhuma contradição entre democracia e censura.

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