Teoria da conspiração
Espalhou-se a ideia de que vivemos num sufocante totalitarismo antidemocrático. Na blogosfera, na imprensa escrita, na televisão, são inúmeras as intervenções e testemunhos nesse sentido. A ideia não decorre de uma constatação genérica, discurso especializado sobre as agruras e novidades do hipermodernismo que tivesse a intensão de denunciar e analisar a nova sociedade de controlo. Pelo contrário, a ideia que tem sido reiterada até à exaustão prende-se com uma subterrânea ligação entre este putativo estado de controlo absoluto e o governo socialista. Aqui aparecem as mais disparatadas associações: desde o Ppereira e a horda de extrema-direita do Blasfémias e quejandos a equacionar a situação actual com o pesadelo Orweliano até ao latir do VPV no pasquim Publico a suspirar por tempos mais serenos onde as quinas ainda enfeitavam uma bela lapela de cor bége.
Há pelo menos duas ideias que perpassam nesta litania; as duas, quanto a mim, tão inteligentes quanto cínicas e mentirosas. Primeiramente, uma decorrência natural (estrutural) do ideário socialista para uma sociedade totalitária. Esta é a forma mais exagerada, mas porventura também aquela que provoca um impacto maior. As frases feitas vendem bem no mundo dos tablóides. Esta vertente apresenta o comportamento do partido socialista actual como a sua real natureza; uma espécie de revelação da sua verdadeira identidade que só poderia desembocar no controlo absoluto. Segundo esta linha de raciocínio, todo o socialismo, mesmo o socrático, acaba pervertido naquilo que em essência sempre sonhou ser: um Estado totalitário de poder concentracionário.
A segunda linha é mais branda e advoga que as formas censurantes deste governo socialista são qualitativa e quantitativamente diferentes das dos anteriores governos. É com Sócrates, dizem os seus arautos, que as liberdades se restringiram à sua menor expressão – porque o homem é despótico por natureza (lembra-se o jargão do quero posso e mando aplicado frequentemente a Sócrates) e porque quem lhe faz frente não resiste nem mais um dia. Um Calígula dos tempos actuais, portanto. Esta segunda vertente da paranóia libertária encontra a sua expressão mais enfática nos artigos de ABarreto.
Seja como for, a mensagem central é a de que se assiste a uma superlativização do poder socialista na sociedade portuguesa. Esta teoria, que tem muito de próximo com uma banal teoria da conspiração, parte do pressuposto de que a sociedade portuguesa era transparente e livre antes da chegada dos socialistas ao poder governativo. Elabora-se portanto consoante duas falácias, a saber, a sociedade portuguesa é transparente e os seus cidadãos são livres de optar, a sociedade portuguesa encontra-se refém de uma estratégia de sabotagem das liberdades individuais, estratégia essa que é reconhecível pelo proliferar do aparatus do poder. Esta proliferação não se restringe à mera constatação da distribuição de lugares públicos pelos membros do partido do governo, algo que seria prontamente assimilável a uma estratégia partidária. Vai muito para além disso. Assim, pode PPereira fazer soar os sinos a alertar a população contra a via verde, o cartão do cidadão, etc (estranho é que deixe de fora o telemóvel) num artigo que tem tanto de disparatado como de cómico (No Público de 26 de Maio de 2007 sob o título “Uma vida, uma ficha”). Todo o artigo sugere que esta parafrenália de tecnologias do poder foi implementada pela mão centralizadora de Sócrates. PPereira acordou para a evidência do controlo orweliano com a ditadura socrática; acordou portanto, tarde.
O que faz pena é que os “tempos que correm” mereciam de facto uma análise das deficientes liberdades e da gradual supressão dos direitos. Eventualmente enquadrada na conceptualização da hipermodernidade, que me parece ser o modelo teórico que melhor capta as modificações sociais e políticas pelas quais temos vindo a passar. A hipertrofia descabelada das críticas à conduta socialista esconde a exígua atenção prestada a estas dinâmicas, bem mais fundamentais para perceber o clima sufocante para onde as democracias actuais nos conduzem. Sucede que estas estão muito para além da efemeridade de um qualquer governo socialista.
Há pelo menos duas ideias que perpassam nesta litania; as duas, quanto a mim, tão inteligentes quanto cínicas e mentirosas. Primeiramente, uma decorrência natural (estrutural) do ideário socialista para uma sociedade totalitária. Esta é a forma mais exagerada, mas porventura também aquela que provoca um impacto maior. As frases feitas vendem bem no mundo dos tablóides. Esta vertente apresenta o comportamento do partido socialista actual como a sua real natureza; uma espécie de revelação da sua verdadeira identidade que só poderia desembocar no controlo absoluto. Segundo esta linha de raciocínio, todo o socialismo, mesmo o socrático, acaba pervertido naquilo que em essência sempre sonhou ser: um Estado totalitário de poder concentracionário.
A segunda linha é mais branda e advoga que as formas censurantes deste governo socialista são qualitativa e quantitativamente diferentes das dos anteriores governos. É com Sócrates, dizem os seus arautos, que as liberdades se restringiram à sua menor expressão – porque o homem é despótico por natureza (lembra-se o jargão do quero posso e mando aplicado frequentemente a Sócrates) e porque quem lhe faz frente não resiste nem mais um dia. Um Calígula dos tempos actuais, portanto. Esta segunda vertente da paranóia libertária encontra a sua expressão mais enfática nos artigos de ABarreto.
Seja como for, a mensagem central é a de que se assiste a uma superlativização do poder socialista na sociedade portuguesa. Esta teoria, que tem muito de próximo com uma banal teoria da conspiração, parte do pressuposto de que a sociedade portuguesa era transparente e livre antes da chegada dos socialistas ao poder governativo. Elabora-se portanto consoante duas falácias, a saber, a sociedade portuguesa é transparente e os seus cidadãos são livres de optar, a sociedade portuguesa encontra-se refém de uma estratégia de sabotagem das liberdades individuais, estratégia essa que é reconhecível pelo proliferar do aparatus do poder. Esta proliferação não se restringe à mera constatação da distribuição de lugares públicos pelos membros do partido do governo, algo que seria prontamente assimilável a uma estratégia partidária. Vai muito para além disso. Assim, pode PPereira fazer soar os sinos a alertar a população contra a via verde, o cartão do cidadão, etc (estranho é que deixe de fora o telemóvel) num artigo que tem tanto de disparatado como de cómico (No Público de 26 de Maio de 2007 sob o título “Uma vida, uma ficha”). Todo o artigo sugere que esta parafrenália de tecnologias do poder foi implementada pela mão centralizadora de Sócrates. PPereira acordou para a evidência do controlo orweliano com a ditadura socrática; acordou portanto, tarde.
O que faz pena é que os “tempos que correm” mereciam de facto uma análise das deficientes liberdades e da gradual supressão dos direitos. Eventualmente enquadrada na conceptualização da hipermodernidade, que me parece ser o modelo teórico que melhor capta as modificações sociais e políticas pelas quais temos vindo a passar. A hipertrofia descabelada das críticas à conduta socialista esconde a exígua atenção prestada a estas dinâmicas, bem mais fundamentais para perceber o clima sufocante para onde as democracias actuais nos conduzem. Sucede que estas estão muito para além da efemeridade de um qualquer governo socialista.
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