Hai é kê?
A ideia preconizada por um liberal, os "iguais" que cooperam, encontrar-se-á em algum lado? Um caso singelo que respiguei nos analles da quotidianidade. Discutia-se a razão pela qual se fumava nas salas dos professores – algo para o qual não possuímos elementos que o confirmassem ou infirmassem, mas a hipótese era puramente académica –, e por que razão não se fumava no metropolitano. Em fundo, a teoria da ordem espontânea de Hayek; e como modelo recalcitrante o facto de ela não chegar para explicar a diferença entre as situações.
Comiam-se entretanto jaquinzinhos e pezinhos de coentrada, tudo regado com um tinto de Reguengos. Aos jaquinzinhos devoram-se as cabeças, o que se pode fazer também com as lampreias, sobretudo quando ainda na infância. Hayek misturava-se naquele bolo pastoso do jaquinzinho com as espinhas que vão cedendo à mastigação, mas opondo uma, ainda que frágil, resistência, ao atravessar a garganta, resistência que é sentida por um ligeiro arranhar nas amígdalas, e que por ali fica, volteando, até ao momento de ser deglutida. Ele foi o primeiro a dizer: a ord esponta nea do hayek prevê qu o individu seja liv de escolhe...Sim, sim, dizia um segundo enquanto despejava um copo de reguengos, ma issliuuu terliiia qulee serllle acorldldado entle tdos.
No outro dia encontraram-se pela manhã. E pela manhã o que as pessoas normalmente fazem, quando não atingem pássaros com uma persão d’ar, é jogar golfe. No campo arrastavam os pés pela erva viçosa e alguém lembrou “oh shadow of myself” que tinha a ver com folhas e que fossem de erva; foi então que ele retirou o cachimbo da boca, ajeitou ponderosamente as calças de xadrez e propôs:
A questão inicial era a de saber se se pode chegar a um consenso sem a intervenção de uma instância exterior. O L. afirma que não se fuma no metropolitano porque há uma autoridade "externa" aos utentes. Pensando que os professores e os alunos são, em medidas diferentes, os utentes da escola, contraponho que também aqui existe uma autoridade externa: o sistema de avaliações a que os professores são sujeitos, as progressões na carreira, a censura exercida pelos colegas, etc. São tudo instâncias externas que limitam a iniciativa individual, e às quais o indivíduo aprende - haverá outra forma? - a usar.
Então por que razão não se fuma no metropolitano e se fuma na sala dos professores? Porque na segunda situação a regra é mais fácil de quebrar, enquanto na primeira, como foi dito, a sanção é mais provável e portanto exerce consequências mais imediatas.
O que este exemplo singelo mostra é que não existe qualquer continuidade necessária entre a regra e a moral individual, como o raciocínio do rui parece sugerir. Pelo contrário, os indivíduos compreendem e interpretam a regra; sabem também julgar as possibilidades de sanção, e agem consoante esse julgamento e essa interpretação. De certa forma, o facto de a catalaxia – a ordem espontânea do Hayek - resultar é porque os indivíduos conseguem compreender a compreensão dos outros, e não porque exista algum fundamento moralmente superior na sua acção, seja ele ditado por deus, seja pelo utilitarismo dos fins.
O taco pendia-lhe da mão e agitava-se com um, dir-se-ia, magnânimo movimento do pulso. Magnânimo porque parecia autónomo e não depender de coisa nenhuma, a não ser talvez do rolex d’ouro que marcava o compasso – alguns já teriam dito – pelo ponteiro dos segundos; com um incrustação de diamantes, na ponta em forma de flecha assestada aos traços que se seguiam geometricamente separados uns dos outros. Continuou, ou mesmo, sem querermos exagerar, concluiu:
O que nos leva à questão que é afinal o estado do mundo, e não a fantasia neoliberal. Segundo Hayek, a catalaxia resulta porque “todos aceitam as mesmas regras e ninguém faz batota”, e só assim o resultado emergente deve ser aceite como justo. Ora se há coisa que está mais longe da realidade é que todos aceitem as mesmas regras. A mim parece-me a batota, a mentira, a trapaça, comportamentos bem mais fundamentais do ser humano do que a pressuposta angélica orientação para a regra.
A catalaxia é uma interessante hipótese de trabalho, mas é só isso mesmo. Para ser justa necessita de mais qualquer coisa...talvez do legislador. Mas este, como verificámos pela diferença entre o comportamento do metropolitano e na sala dos professores, nunca é espontâneo. Quod erum demonstrandum.
A locução latina fez com que o caddy esboçasse um sorriso, meio comprometido, mas certamente nada desrespeitoso. Tinha-se afeiçoado ao caddy, mas nada de sexual, apenas um amor platónico, ao qual o caddy correspondia com leituras surtidas da crítica da razão pura, tentando-o surpreender com intrincadas questões sobre o estatuto dos julgamentos a priori num estádio de futebol. Bonomicamente, lá se ia prestando a esse exercício, com uma delicadeza de rei babilónico e com a voluntariedade de um nadador-salvador. O seu companheiro, agachando-se para fazer o nó nos cordões de um dos sapatos – o do pé esquerdo – acrescentou, mas mesmo que assim fosse alguém teria que outorgar o lugar ao legislador. Ao que ele respondeu, quase num sussurro, que deixava prever um certo agastamento, o suficiente para sentir aquela dormência na espinha que o assaltava quando procurava extrair tufos de cabelos do interior do ralo da banheira, utilizando para isso uma espátula improvisada, feita a partir de uma carga de caneta já usada, com uma armação de arame na ponta: o Estado quer você dizer? Não, um ser superior!, redarguiu.
Comiam-se entretanto jaquinzinhos e pezinhos de coentrada, tudo regado com um tinto de Reguengos. Aos jaquinzinhos devoram-se as cabeças, o que se pode fazer também com as lampreias, sobretudo quando ainda na infância. Hayek misturava-se naquele bolo pastoso do jaquinzinho com as espinhas que vão cedendo à mastigação, mas opondo uma, ainda que frágil, resistência, ao atravessar a garganta, resistência que é sentida por um ligeiro arranhar nas amígdalas, e que por ali fica, volteando, até ao momento de ser deglutida. Ele foi o primeiro a dizer: a ord esponta nea do hayek prevê qu o individu seja liv de escolhe...Sim, sim, dizia um segundo enquanto despejava um copo de reguengos, ma issliuuu terliiia qulee serllle acorldldado entle tdos.
No outro dia encontraram-se pela manhã. E pela manhã o que as pessoas normalmente fazem, quando não atingem pássaros com uma persão d’ar, é jogar golfe. No campo arrastavam os pés pela erva viçosa e alguém lembrou “oh shadow of myself” que tinha a ver com folhas e que fossem de erva; foi então que ele retirou o cachimbo da boca, ajeitou ponderosamente as calças de xadrez e propôs:
A questão inicial era a de saber se se pode chegar a um consenso sem a intervenção de uma instância exterior. O L. afirma que não se fuma no metropolitano porque há uma autoridade "externa" aos utentes. Pensando que os professores e os alunos são, em medidas diferentes, os utentes da escola, contraponho que também aqui existe uma autoridade externa: o sistema de avaliações a que os professores são sujeitos, as progressões na carreira, a censura exercida pelos colegas, etc. São tudo instâncias externas que limitam a iniciativa individual, e às quais o indivíduo aprende - haverá outra forma? - a usar.
Então por que razão não se fuma no metropolitano e se fuma na sala dos professores? Porque na segunda situação a regra é mais fácil de quebrar, enquanto na primeira, como foi dito, a sanção é mais provável e portanto exerce consequências mais imediatas.
O que este exemplo singelo mostra é que não existe qualquer continuidade necessária entre a regra e a moral individual, como o raciocínio do rui parece sugerir. Pelo contrário, os indivíduos compreendem e interpretam a regra; sabem também julgar as possibilidades de sanção, e agem consoante esse julgamento e essa interpretação. De certa forma, o facto de a catalaxia – a ordem espontânea do Hayek - resultar é porque os indivíduos conseguem compreender a compreensão dos outros, e não porque exista algum fundamento moralmente superior na sua acção, seja ele ditado por deus, seja pelo utilitarismo dos fins.
O taco pendia-lhe da mão e agitava-se com um, dir-se-ia, magnânimo movimento do pulso. Magnânimo porque parecia autónomo e não depender de coisa nenhuma, a não ser talvez do rolex d’ouro que marcava o compasso – alguns já teriam dito – pelo ponteiro dos segundos; com um incrustação de diamantes, na ponta em forma de flecha assestada aos traços que se seguiam geometricamente separados uns dos outros. Continuou, ou mesmo, sem querermos exagerar, concluiu:
O que nos leva à questão que é afinal o estado do mundo, e não a fantasia neoliberal. Segundo Hayek, a catalaxia resulta porque “todos aceitam as mesmas regras e ninguém faz batota”, e só assim o resultado emergente deve ser aceite como justo. Ora se há coisa que está mais longe da realidade é que todos aceitem as mesmas regras. A mim parece-me a batota, a mentira, a trapaça, comportamentos bem mais fundamentais do ser humano do que a pressuposta angélica orientação para a regra.
A catalaxia é uma interessante hipótese de trabalho, mas é só isso mesmo. Para ser justa necessita de mais qualquer coisa...talvez do legislador. Mas este, como verificámos pela diferença entre o comportamento do metropolitano e na sala dos professores, nunca é espontâneo. Quod erum demonstrandum.
A locução latina fez com que o caddy esboçasse um sorriso, meio comprometido, mas certamente nada desrespeitoso. Tinha-se afeiçoado ao caddy, mas nada de sexual, apenas um amor platónico, ao qual o caddy correspondia com leituras surtidas da crítica da razão pura, tentando-o surpreender com intrincadas questões sobre o estatuto dos julgamentos a priori num estádio de futebol. Bonomicamente, lá se ia prestando a esse exercício, com uma delicadeza de rei babilónico e com a voluntariedade de um nadador-salvador. O seu companheiro, agachando-se para fazer o nó nos cordões de um dos sapatos – o do pé esquerdo – acrescentou, mas mesmo que assim fosse alguém teria que outorgar o lugar ao legislador. Ao que ele respondeu, quase num sussurro, que deixava prever um certo agastamento, o suficiente para sentir aquela dormência na espinha que o assaltava quando procurava extrair tufos de cabelos do interior do ralo da banheira, utilizando para isso uma espátula improvisada, feita a partir de uma carga de caneta já usada, com uma armação de arame na ponta: o Estado quer você dizer? Não, um ser superior!, redarguiu.
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