Wednesday, November 14, 2007

A serpente e a maçã

É interessante ler a transcrição do fecho da cimeira latino-americana publicada na íntegra no El País. Sin embargo, ficamos com a sensação que Zapatero estava a tentar amacear ( e não ameaçar) Chávez, sermoneando-lhe as virtudes do mercado livre. Por detrás de tão samaritana vontade, encontravam-se as indiscutíveis razões das empresas espanholas que tantos e bons investimentos possuem na Venezuela. A conversa de Zapatero é o que, vulgo, se chama banha da cobra, conversa para embalar meninos, conversa da treta, ou uma outra qualquer modalidade do vernáculo português que se aplique ao acto de tentar persuadir artificiosamente. Resumia-se, portanto, a tentar convencer Chávez que o caminho das nacionalizações não é o mais acertado; que há que pensar nos interesses das multinacionais que podem, de um dia para o outro, ver o seu pecúlio confiscado.
Lembro Morales, convidado especial de John Stewart no Late Night Show, a explicar que antes das nacionalizações o dinheiro que ficava no país cifrava-se em muitos milhões de dólares, sem dúvida resultado de receitas fiscais, e que depois das mesmas passou a ascender a vários biliões.
John, como bom anfitrião que é, não o mandou calar nem se levantou e abandonou a sala. Ficou apreensivo, è vero, olhando para aquele homem envergando um poncho num estúdio nova iorquino e falando de nacionalizações num lugar onde a mera utilização da palavra pode dar pena capital. Mas dentro da apreensão que podia ser oscultada no olhar meio suspenso meio trocista de John, vislumbrava-se um lampejo de dúvida, uma mínima suspensão de certezas que parecia dizer: e se ele tivesse razão?
Zapatero e o rei, não concedem o benefício da dúvida. Estão demasiado atarefados a congeminar golpes de estado e conspirações contra os novos regimes. Por isso, quando Zapatero terminou o monólogo sobre as virtudes do mercado livre, Chávez lembrou que já lhe tinham vindo com a cantiga, mas de forma mais texana, mais Sergio Leoni, mais coldre lubrificado, com um enfático joder, hombre! E acrescentou, com alguma parcimónia lógica, conquanto temperada com verve assinina, que aquilo já ele sabia no que dava, e que àquele clube não queria ele pertencer. Não fez mais do que aplicar a velha máxima marxiana (dos irmãos Marx, claro está!) segundo a qual não se pertence a um clube que nos queira para sócios.

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