Tuesday, August 07, 2007

O elogio da preguiça


Se seguirmos aí pelos meandros da blogosfera encontraremos certamente uma ilustrada troca de galhardetes sobre a preguiça dos portugueses. Não tenho argumentos técnicos para rebater nem um lado nem o outro, embora esteja convencido que o segundo está acompanhado da razão e o primeiro é apenas um filibusteiro (citando esse grande anarquista que era o capitão Haddock) das sondagens e da ideologia neoliberal. Tem o segundo atenuantes? Tem: não é tão insuportável como um Ar roja, nem tão cínico como um Antão, pois então. Mas não deixa por isso de ser um lobinho disfarçado de cordeiro, algo que a malta aqui, que é matreira, não deixou passar em branco.
Quanto ao resto, e recusando os argumentos técnicos, o que devemos é invocar o direito à preguiça! Não ao animal, mas quem quiser ter uma faça favor que não vejo nada em contrário – conheci alguém que tinha um saguim preso por uma trela no terreiro à porta da garagem e que puxava as saias tanto a meninas púberes como a balzaquianas com artrose – por que não o simpático animal preguiça que possui um olhar bem mais doce, conquanto melancólico, e que nos deixa suspensos no seu deslocar lento como aquela sensação que nos é transmitida quando o nosso olhar se retém no voo concêntrico de algumas áves – por exemplo o chapim. Deixo ao critério do leitor anónimo ou da porteira do andar térreo.
Pois vejo aqui um capcioso e subterrâneo ataque à preguiça. Este ataque, o PM se calhar não sabe, ou se calhar sabe mas não quer dizer, o que vem dar no mesmo, elabora-se segundo um “parologismo”. Que é um paralogismo para enganar parolos – que obviamente o Pedro considera que nós todos somos. E esta sacanisse nem é dirimida pela comparação de mais e melhores sondagens ou por maior honestidade na escolha dos indicadores. É um verdadeiro espinho ideológico encrustrado na carne da razoabilidade.

Primeiro, é o trabalhador que é preguiçoso, e é o empregador que sofre – e como? Pagando a preguiça do trabalhador. A relação nunca é reversível. Mesmo que estatisticamente agregados – trabalhadores e empregadores de braço dado na grande marcha dos indicadores macro-económicos - o que está sujacente nesta comparação é uma dissimetria entre o valor, moral, do trabalho do trabalhador e o trabalho do empregador. O empregador, como por magia, fica de fora do julgamento, moral, sobre o valor do seu trabalho. Já me esquecia, o trabalho do empregador é hetero-referencial: mede-se na produtividade dos trabalhadores. Se o primeiro não singra é porque os segundos são uns madraços. Donde, ou o empregador não trabalha; ou a categoria de preguiça nem sequer é aplicável àquilo que ele faz – seja o que fôr, porque pelos vistos não é trabalho Há, na verdade, uma terceira alternativa que o chico-espertismo da economia neoliberal utiliza avonde: o empregador não pode ser preguiçoso porque não é racional ser-se preguiçoso quando se trata do nosso próprio carcanhol. Mas aqui a inversão já é admissível: o trabalhador é preguiçoso, porque é racional ser-se preguiçoso quando não se está a brincar com o próprio carcanhol. Um paradigma bem mais pregnante, para falar como um cognitivista, se encontra por detrás desta justaposição de brincadeiras ideológicas e que é o seguinte: o trabalhador trabalha porque o empregador lhe dá a oportunidade para isso.
Pensemos, invertendo novamente os termos da equação, que o empregador singra porque o trabalhador lhe concede os recursos necessários para isso – ficaria por conseguinte o empregador penhorado em relação ao trabalhador. A relação moral inverter-se-ia e o trabalhador teria direito a pronunciar-se sobre a preguiça do empregador. E como o faria? Eventualmente à cachaporra.
(este post não faz muito sentido. Prometo que o próximo será melhor. Dias.)

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